Por Téta Barbosa (*)
Eu gosto de animais, com ressalvas, muitas ressalvas. Criada
em apartamento, eu tinha pavor de galinhas, do tipo que pessoas normais têm de
baratas ou aranhas. Eu também temia gatos, coelhos, hamsters e cachorros.
Principalmente cachorros.
Nada contra, juro, só falta de costume mesmo. Meus bichos
eram de pelúcia e não tinham cheiro (exceto uma eventual poeira ou mofo) e não
babavam. Cresci assim, desacostumada ao reino animal, praticamente a menina da
bolha.
Provavelmente por isso nunca entendi o amor incondicional
das pessoas por seus bichos de estimação. Não entender não significa ser
contra, que isso fique bem claro.
E, na minha ignorância animal, entendi menos ainda a recente
comoção nas redes sociais sobre a lei Contra o Abandono de Animais. Veja bem,
não sou a favor de poodles ou gatinhos siameses serem largados por aí, muito
menos concordo com a crueldade contra peixinhos dourados.
Se bem que, se a gente pensar direitinho, o que soa como
crueldade é manter um passarinho numa gaiola, um peixe num aquário de 50cm ou
um pastor alemão num apartamento de 90 m2.
Mas não vamos mudar de assunto, voltemos à Lei Contra o Abandono.
Assim, como fila de banco, que basta o primeiro reclamar para a fila virar um
motim, as redes sociais estão cheias de mensagens de apoio aos Chihuahuas e
gatinhos Angorás.
A lei é digna e bonita, concordo, o que não me convence é
essa comoção social para defender gatos e cachorros enquanto crianças descalças
fazem malabarismo no sinal.
Entenda, eu acho animais legais, mas acho seres humanos mais
legais.
Sou contra o abandono de crianças, contra homens revirarem
lixo à procura do jantar, contra adolescentes que se prostituem para garantir
uma refeição por dia.
Confesso que sempre me revoltei com o Greenpeace porque
enquanto eles salvam as baleias, 300 homens e mulheres são assassinados por mês
em Pernambuco.
Nunca vi uma faixa comum “Salve os seres humanos” nem com um
“Criança passar fome é Crime”. Sempre imaginei, inclusive, que se eu vendesse
aquele navio do Greenpeace, o dinheiro daria para alimentar o Coque (comunidade
carente do Recife) inteiro durante uns seis meses.
Temos exceções, fato; ONGs e voluntários. Mas esses,
infelizmente, não ganham a simpatia das milhões de pessoas que postam fotos de
gatinhos fofos no Facebook.
Vou ser a primeira a apoiar os Yorkshires e Bulldogs, no dia
em que nenhum ser humano morar debaixo de uma ponte ou se alimentar de lixo.
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(*) Publicado no Blog do Noblat em 02.07.2012. Eu sempre
leio a conterrânea Teta Barbosa. Seus textos são concisos e instigantes. Talvez
ao contrário dos meus que são longos e só instigam alguns recalcitrantes. Neste,
ela se reporta à sua relação com animais, em sua infância e na idade adulta. Na
infância eu lembro do meu neto Júlio que tem o mesmo problema da Teta. Tem um
medo danado de tudo que é bicho. E eu não sei porque e nem sempre dou uma de
psicóloga amadora para explicar. Talvez, ele cresça e se torne igual a ela,
privilegiando os humanos.
Eu já fui o contrário, sempre gostei de bichos, e tive, na
infância, com as facilidades que uma casa com quintal nos dar, gatos, cachorros
e outros animais da fauna bom-conselhense. Será que foi por isso que hoje fico
em dúvida se determinadas pessoas valem menos do que certos bichinhos. E
mantendo o politicamente correto de minha consciência de classe média, devo
dizer que também não gostaria que um ser humano se alimentasse de lixo.
Entretanto, formar uma ideologia que pretira um ao outro, não é viável do ponto
de vista humano.
Quando colocamos seres humanos e animais como categorias
abstratas e os colocamos no mundo cruel da escolha, quase todos de bom senso
escolhem os seres humanos. Porém, quando descemos ao nosso concreto do dia a
dia, e olhamos na cara de certos humanos e suas atitudes, não há como não preferirmos
algumas animais, mesmo que não estejam em extinção. Então cada caso é um caso e
nossa politiquice correta nos trai o tempo todo. Como acontece mesmo com a
Teta, quando levanta a hipótese de vender o navio do Greenpeace para alimentar
crianças. Se fosse mostrada a ela a imagem de uma criança no futuro, passando
fome porque destruíram a terra completamente, talvez hoje ela nem pensasse em
vender o navio hoje, e sim aprimorar sua missão.
É um tema para muita reflexão, inclusive, a minha sobre a
atitude do meu neto em ter medo de certos animais. Ao contrário da Teta, ele é
homem, e para mim há um problema a mais. O meu machismo que se enruste em cada mulher de minha idade, nascida no
interior, que me leva certas horas a querer dizer que ele, por ser homem, não deve ter medo, e tentar entender que nem todos
tem os mesmos sentimentos, sejam sobre animais ou sobre outras coisas.
Reflitamos.
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