segunda-feira, 30 de abril de 2012

Sonhando com o sangue azul





Semana passada estava fazendo um périplo pelos laboratórios da cidade. A vida moderna, com a medicina moderna, torna esta atividade obrigatória para quem está se aproximando da “boa idade”. E parece que só os médico devem considerá-la boa mesmo, pois são eles que mais lucram com ela, depois dos planos de saúde, é claro. E no Brasil, feliz de quem ainda pode pagar um plano para não cair na malha fina do SUS. Malha fina porque, entrou nele, vira suco.

A esperança de vida dos seres humanos subiu muito nos últimos tempos e já nos alertam que quem nascer por estas datas recentes, como meus netos, terá esperança de vida de quase 100 anos, e daí para imortalidade, é só esperar nascer em 2100. Eu, pessoalmente, não vejo muita vantagem nisto, se a esperança de vida que a medicina nos der for inteiramente para zanzar de hospital em hospital, de laboratório em laboratório ou de médico em médico. Termina que, a esperança de vida boa vai se restringir à que tínhamos no século XIX, ou anterior.

Chego a um laboratório e antevejo, com quase exatidão a conversa, depois de passar numa maquininha e tirar uma senha, olhando a expressão triste das pessoas que já estão sentadas e de quando em vez, olham a sua para saber se serão atendidas no mesmo dia.

E chegando mais gente. O que nos deixa animada, pois sabemos que há seres em pior situação. Quão pérfido pode ser o ser humano em determinadas ocasiões. Depois de ouvir um som, ao qual prefiro a voz da Gabi Amarantos na novela das domésticas, e ver que o número 152 é o meu, dirijo-me ao portão de embarque, digo, ao guichê lá anunciado:

- Qual o seu plano de saúde? Carteirinha e RG.

- Tudo isto?

- É claro. Como eu poderia saber que a senhora é você mesma?!

- Minha filha, onde nós estamos?  Será que alguém mandaria outra pessoa fazer exames médicos por ela?

- Estamos no Brasil, minha senhora. O pessoal manda gente doente para fazer o exame por ela e depois faltar ao trabalho. Isto já aconteceu.

- Pensando bem, você está certa. Há poucos dias o José Sarney colocou um aparelho no coração, lá no SUS do Congresso, o Sírio Libanês, só para não instalar uma CPI. E até ameaçou um médico (penso que era um residente) que cismava em dizer que ele não tinha nada. Tá bom, tá aqui meus documentos e o pedido do exame.

- Está em jejum?

- O quê?!

- Está em jejum de 12 horas, minha senhora?! Parou de comer 12 horas antes?

- Ah, sim! Desculpe minha filha, pois eu sou do interior e lá em Bom Conselho quando diziam que uma mulher estava “em jejum”, queriam dizer que ela estava “desprevenida”, sem calcinha, se é que você me entende. Era um vexame. Hoje virou moda. Você está em jejum, minha filha?!

- Não minha senhora. E a  senhora está?

- Estou sem comer há 12 horas?

- Que remédios a senhora está tomando?

- Tomo aquele de pressão, como é que é mesmo? Aquele para colesterol, aquele para alimentar meus neurônios em decadência e....

- Tá bom, já tenho aqui em sua ficha. A senhora continua tomando todos?

- Continuo, e espero que não aumente a lista depois dos exames.

- Pronto, volte e aguarde a chamada do seu nome.

E eu volto para a sala, meu lugar já está tomado e tenho que ficar em pé para tomar o lugar do outro que será inquirido em seguida. E fico lá meditando, lendo alguma coisa que levei, e que agora é um livro que me foi emprestado pelo Zézinho de Caetés, que é ótimo. Ele mostra com riqueza de detalhes como foi a trajetória de Lula, de Caetés até um pouco antes dele pousar no Sírio-Libanês, fugindo do SUS. (O que sei de Lula – José Nêumanne Pinto), do qual retiro e medito sobre o seguinte trecho:

É possível dizer que Luiz Inácio da Silva nasceu no certo, na hora certa, na família certa.

 ....

O mundo que acolheu Luiz Inácio em 27 de outubro de 1945 era completamente diferente daquele em que os seres humanos eram definidos como senhores e escravos, proprietários e servos, nobres e plebeus, ricos, remediados e pobres. O capitalismo predominante, pelo menos no Ocidente, permitiu, como nunca antes em qualquer regime econômico, a mobilidade social.

Depois eu farei outros textos sobre este livro esclarecedor cujo protagonista é o  nosso Lula, que hoje, sem colírio usa óculos escuros como ilustra a foto deste texto. Ele deveria ser muito grato ao capitalismo, e o foi, embora sempre dizendo que era socialista e dando tapinha nas costas do Fidel. Igualzinho ao meu conterrâneo Marlos.

Mas, eu estou em exame, gente. Volto, e ouço a moça, com um papel na mão dizer: Maria Lúcia..., e eu não dou nem tempo de terminar, corro para ela, que muito solícita, neste caso, diz, muito gentilmente:

- Sente, coloque o braço aqui e feche a mão!

Eu obedeço com o rosto voltado para o outro lado, pois já fui furada muitas vezes, mas, ainda hoje reluto em sê-lo, vendo a furada. A moça é boa de seringa e quase nem sinto a picada. Só vejo o sangue jorrar dentro de um vidro, e apenas me pergunto:

-Será que o sangue do Lula é azul?

P.S.: Não resisti e coloquei a mesma foto que saiu na AGD, e em outros blogs, do Lula e a Dilma de óculos escuros, mesmo porque ontem passei algumas horas com um igual assistindo a um filme 3D, mas, isto é assunto que conto depois.

Um comentário:

  1. Que beleza!
    Há tempos não leio algo assim. Hilário e provocativo! Parabéns!

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