terça-feira, 20 de março de 2012

Os crucifixos nos tribunais




Todos sabem que sou uma religiosa, e católica praticante, dentro dos limites que Deus traçou, junto com o seu Filho Jesus Cristo para que fosse erigida um Igreja onde nós, pobres mortais, pudéssemos exercer nossa fé. Ou seja, Deus vem antes e a Igreja Católica depois, formada por homens, que mesmo com inspiração divina, são homens e portanto passíveis de erro.

Por isso, de vez em quando eu me insurjo contra determinadas diretrizes de nossa Santa Madre Igreja, quando minha consciência ausculta em suas ações coisas que extrapolam as Sagradas Escrituras, lidas com vãs interpretações. Por exemplo, eu não sei porque não se permite que os padres casem nem sei também porque as mulheres não podem exercer o sacerdócio. Se alguns dizem que era porque os apóstolos e o próprio Jesus eram homens, eu retruco que a Virgem Maria e Maria Madalena eram mulheres.

Esta semana recebi uns e-mails que falavam do fato ocorrido no Rio Grande do Sul, onde, no escurinho dos tribunais, os magistrados resolveram acatar um requerimento da Liga Brasileira das Lésbicas e entidades afins, para a retirada de crucifixos das dependências do Tribunal e dos Fóruns daquele Estado. A base dos requerentes era a de que o julgamento em uma sala com um expressivo símbolo de uma igreja e sua doutrina não parece a melhor forma de se mostrar o Estado que julga como sendo equidistante dos valores em conflito.

Um dos e-mails que recebi é longo e defende a manutenção dos crucifixos nas salas com base, principalmente, no seguinte princípio: “Estado laico não é sinônimo de Estado ateu ou agnóstico, mas sim de um Estado que adota a liberdade de todas as crenças religiosas e garante sua prática, como também respeita, como não poderia deixar de respeitar, os valores cristãos que deram base à formação da Nação brasileira.” Eu, em minha modesta opinião de uma católica que o é, mas não é ovelha para ser tangida por pastores, e sim pela minha consciência, não sei onde minhas amigas lésbicas e afins foram se basear para dizer que a presença de um crucifixo levaria um juiz a ser contra ou a favor de alguém, se antes ele não professasse nenhuma fé que o influenciasse, ou mesmo, fé nenhuma, como meu amigo Cleómenes Oliveira ou o meu amigo sumido o Roberto Lira.

No entanto, eu sei porque os amigos do Crô, ou meus amigos da Papacagay, que continua atuando mesmo sentindo o preconceito dos machões de minha terra, se sentiram impelidos para uma tal estapafúrdia ação. É que homossexual em muitos lugares tem até medo de gente religiosa, principalmente, dos cristãos evangélicos, e mesmo de alguns padres que usam sua hipocrisia humana para ditar normas divinas. O que eles estão enganados é apenas pensarem que a retirada pura e simples do crucifixo vai defendê-los de alguma mal.

O que eu proponho, embora sabendo que é um solução parcial, no entanto, talvez mais efetiva para aqueles que acham que privilegiar o cristianismo é a inclusão dos símbolos de outras religiões, ao invés da exclusão do crucifixo. Eu acredito que só há um Deus, que é o ser perfeitíssimo criador do céu e da terra como D. Lourdes Cardoso me ensinou no catecismo. E o caminho que levará à perfeição do ponto de vista religioso é uma única religião em que todos estamos irmanados, e que seus símbolos são apenas símbolos e nada mais, quando fora dos templos.

É por isso que uma vez lutei por um culto ecumênico na abertura do Encontro de Papacaceiros e não uma missa, que de uma forma ou de outra afugenta nossos irmãos evangélicos e até mesmos os agnósticos conscientes ou inconscientes. Eu sei que por causa da tentativa de se mostrar que “nossa” religião é a verdadeira, muita gente já morreu em guerras e ainda morre, e que está longe desta união em torno de Deus. No entanto, a abertura de todos diante dos valores religiosos de todos, que me desculpem os amigos ateus e agnósticos, é um caminho para verdadeira paz, neste mundo, porque no outro seremos recebidos pelo mesmo Deus, que único.

Mas, logo em seguida, recebi um e-mail do conterrâneo Valfrido Curvelo, que saindo de suas obrigações como presidente de um partido, faz a gentileza de azeitar este meu cérebro já duro com coisas excelentes. Desta vez, ele me enviou um texto do Paulo Brossard, que para mim é iluminante nesta questão de tirar ou deixar os crucifixos nas salas da justiça.  Trancrevo-o abaixo e depois eu volto para o arremate:

Tempos apocalípticos

Paulo Brossard  Jornal Zero hora

Minha filha Magda me advertiu de que estamos a viver tempos do Apocalipse sem nos darmos conta; semana passada, certifiquei-me do acerto da sua observação, ao ler a notícia de que o douto Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado, atendendo postulação de ONG representante de opção sexual minoritária, em decisão administrativa, unânime, resolvera determinar a retirada de crucifixos porventura existentes em prédios do Poder Judiciário estadual, decisão essa que seria homologada pelo Tribunal. Seria este “o caminho que responde aos princípios constitucionais republicanos de Estado laico” e da separação entre Igreja e Estado.

Tenho para mim tratar-se de um equívoco, pois desde a adoção da República o Estado é laico e a separação entre Igreja e Estado não é novidade da Constituição de 1988, data de 7 de janeiro de 1890, Decreto 119-A, da lavra do ministro Rui Barbosa, que, de longa data, se batia pela liberdade dos cultos. Desde então, sem solução de continuidade, todas as Constituições, inclusive as bastardas, têm reiterado o princípio hoje centenário, o que não impediu que o histórico defensor da liberdade dos cultos e da separação entre Igreja e Estado sustentasse que “a nossa lei constitucional não é antirreligiosa, nem irreligiosa”.

É hora de voltar ao assunto. Disse há pouco que estava a ocorrer um engano. A meu juízo, os crucifixos existentes nas salas de julgamento do Tribunal lá não se encontram em reverência a uma das pessoas da Santíssima Trindade, segundo a teologia cristã, mas a alguém que foi acusado, processado, julgado, condenado e executado, enfim justiçado até sua crucificação, com ofensa às regras legais históricas, e, por fim, ainda vítima de pusilanimidade de Pilatos, que tendo consciência da inocência do perseguido, preferiu lavar as mãos, e com isso passar à História.

Em todas as salas onde existe a figura de Cristo, é sempre como o injustiçado que aparece, e nunca em outra postura, fosse nas bodas de Caná, entre os sacerdotes no templo, ou com seus discípulos na ceia que Leonardo Da Vinci imortalizou. No seu artigo “O justo e a justiça política”, publicado na Sexta-feira Santa de 1899, Rui Barbosa salienta que “por seis julgamentos passou Cristo, três às mãos dos judeus, três às dos romanos, e em nenhum teve um juiz”… e, adiante, “não há tribunais, que bastem, para abrigar o direito, quando o dever se ausenta da consciência dos magistrados”.   Em todas as fases do processo, ocorreu sempre a preterição das formalidades legais. Em outras palavras, o processo, do início ao fim, infringiu o que em linguagem atual se denomina o devido processo legal. O crucifixo está nos tribunais não porque Jesus fosse uma divindade, mas porque foi vítima da maior das falsidades de justiça pervertida.

Não é tudo. Pilatos ficou na história como o protótipo do juiz covarde. É deste modo que, há mais de cem anos, Rui concluiu seu artigo, “como quer te chames, prevaricação judiciária, não escaparás ao ferrete de Pilatos! O bom ladrão salvou-se. Mas não há salvação para o juiz covarde”

Um belo e salomônico (tirando o fato de enfatizar a "opção sexual minoritária" dos requerentes) texto mostrando uma interpretação laica que pode se dar ao crucifixo para convencer os juízes, religiosos ou não, que ele está nos tribunais para evitar as besteiras que se fazem lá, em nome da justiça, como aconteceu com o julgamento do Cristo.

Embora não retirando a força de minha sugestão de que se deve aumentar e não diminuir o número de símbolos religiosos nos tribunais e noutros lugares, o texto do Brossard chega mesmo a reforçá-la, pois em qualquer símbolo religioso sempre encontraremos valores relevantes para impedir que se cometam injustiças. Devido ao já excesso de toques, para os meus padrões de prolixidade atual, eu apenas lembro um símbolo que ficando ao lado do crucifixo, evitaria que os juízes se comportassem como homens de Hitler: A estrela de Davi ou a Menorá.

P.S.: Comecei este texto já algum tempo mas o vereador Carlos Alberto, com o seu natimorto projeto de feriado não me deixou terminar. Ainda acho que ele é importante e estou publicando hoje, já depois de ler uma reação contra a posição do Rio Grande do Sul. Meditem e comentem se quiserem.

3 comentários:

  1. COMO SEMPRE QUERIDA LUCINHA,EXCELENTE MATÉRIA;TAMBÉM CONCORDO COM SEU PONTO DE VISTA NO QUE REFERE-SE AO CELIBATO, OS PADRES DEVIAM CASAR SIM,AFINAL DIZEM QUE O APOSTOLO PEDRO PARA A IGREJA CATÓLICA FOI COMO O PRIMEIRO PAPA, E ERA CASADO. NA BÍBLIA-MATEUS:8-14/15; TENDO JESUS CHEGADO À CASA DE PEDRO,VIU A SOGRA DESTE ACAMADA E ARDENDO EM FEBRE. MAS JESUS TOMOU-A PELA MÃO, E A FEBRE A DEIXOU.ELA SE LEVANTOU E PASSOU A SERVI-LO.-CREIO QUE OS PADRES CASANDO, HAVERIAM MENOS ESCÂNDALOS COM CASOS DE HOMOSSEXUALISMO E PEDOFILIA ENVOLVENDO SACERDOTES.QUANTO AOS CRUCIFIXOS, É UM SINAL DE RESPEITO E FÉ CRISTÃ QUE DEVER SER RESPEITADA COMO TODAS AS RELIGIÕES;JÁ PENSOU SE PROÍBEM OS EVANGÉLICOS DE PORTAREM AS BÍBLIAS NO TRAJETO PARA O CULTO? DETERMINADAS PESSOAS COM PENSAMENTOS TÃO MESQUINHOS, DEVIAM SE PREOCUPAR E TENTAR AJUDAR OS MENORES ABANDONADOS, E VISITAREM OS VELHOS JOGADOS E ESQUECIDOS NOS ASILOS QUE EXISTEM NESSE PAÍS.

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  2. Conterrânea LP, boas tardes!

    É verdade que estou meio sumido. Para ser mais preciso, estou sumindo aos pouco para deixar algum vestígio nesse mundo louco (essa é outra historia).

    Lucinha eu também recebi o email enviado pelo conterrâneo Valfrido, que trata do texto Tempos apocalípticos do Paulo Brossard. E, para não sumir sem deixar um pouco do meu rasto eu o respondi agradecendo pelo email e ao mesmo tempo me desculpando pelas dúvidas que levanto sobre o fato em que se baseia o Paulo Brossard para escrever o referido texto.

    Em um trecho da minha resposta para o Valfrido eu assim manifestei:
    “... a opinião do grande jurista Paulo Brossard, se baseada numa verdade histórica, com certeza é muito pertinente. A dúvida que até hoje eu carrego é se, de fato, essa história do Cristo é verdadeira. Há muito venho procurando evidências da existência do referido personagem e até o momento não encontrei nada que tenha evidenciado essa verdade. Se pesquisarmos na historia da humanidade entre os principais inspiradores/fundadores de religiões e/ou doutrinas filosóficas mais difundidas, tais como: Cristo no cristianismo, Buda (Sidharta Gautama) no budismo; Maomé no islamismo; Confúcio no confucionismo, entre outros; encontraremos algumas dúvidas quanto à existência dos mesmos. Ou melhor, dos ora citados apenas o inspirador da religião cristã é o único que se questiona sua real existência. Isso, no meio historial, que busca evidências para comprovar os fatos históricos. Os demais há provas irrefutáveis das suas existências. Por isso, meu questionamento sobre a pertinência da manifestação do Brossard.”...

    Quanto ao seu texto vou fazer uma breve observação sobre a frase: “No entanto, a abertura de todos diante dos valores religiosos de todos, que me desculpem os amigos ateus e agnósticos, é um caminho para verdadeira paz, neste mundo, porque no outro seremos recebidos pelo mesmo Deus, que único.”. Como amigo, como agnóstico, como conterrâneo, você merece todas as desculpas. Nem precisava nem pedi-las, ESTÁS DESCULPADA. Apesar de desculpável, está sua frase carece de respaldo histórico. Nas minhas observações eu tenho visto as religiões como as principais propulsoras das guerras em toda a História da Humanidade. Sinto sinceramente Lucinha não concordar com você. As religiões não promovem a paz, elas colocam os homens uns contra os outros, uma fé contra a outra e isso em todos os tempos e em todas as partes. Isso é um fato incontestável. O discurso de paz dos representantes das religiões é só para fazer proselitismo. A possível paz entre os homens não está nos símbolos, não está nos livros sagrados, não está nos rituais de nenhuma religião. Ela só poderá surgir quando o homem compreender sua própria essência, ou seja, quando ele descobrir a unicidade da sua espécie, a Unicidade de Deus, enfim, a unicidade da vida. Mas, lamentavelmente, são poucos os que realmente desejam a paz entre os homens.

    Vamos deixar essas bobagens prá lá. Vamos nos concentrar na próxima novela da “Grobo” (kkkkk), pois nesta o que não dá pra rir dá pra chorar.

    Abração, tô suminnnnnnnndo!

    Roberto Lira

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  3. Prezados conterrâneos Saul e Roberto,

    Se eu não estivesse tão ocupada agora em política em geral e na de Bom Conselho em particular, eu entraria neste debate, do lado de Deus, é claro. Por enquanto e por agora, apenas agradeço os comentários e espero que outros ajudem, escrevendo, ajudem o Roberto a não ir para o "fogão" (que Dante tem um).

    Roberto, foi um prazer lê-lo depois de muito tempo. Eu nunca mais tive tempo nem de escrever sobre novela, estou mais ocupada do que a Griselda (que novelinha ruim, esperemos a próxima).

    O Saul, sempre leio e ele agora está discutindo com a Eliúde no Mural da AGD sobre as enquetes. Aquilo tudo é para inflar a audiência do Blog.

    Obrigada a todos pelos comentários, e espero outros dos religiosos, ateus ou agnósticos da terra e de alhures.

    Lucinha Peixoto

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