Por Marco Aurélio Mello
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Infelizmente, vivenciamos
tempos muito estranhos, em que se tornou lugar-comum falar dos descalabros que,
envolvendo a vida pública, infiltraram na população brasileira ─ composta, na
maior parte, de gente ordeira e honesta ─ um misto de revolta, desprezo e até
mesmo repugnância.
São tantas e tão
deslavadas as mentiras, tão grosseiras as justificativas, tão grande a falta de
escrúpulos que já não se pode cogitar somente de uma crise de valores, senão de
um fosso moral e ético que parece dividir o País em dois segmentos estanques ─
o da corrupção, seduzido pelo projeto de alcançar o poder de uma forma
ilimitada e duradoura, e o da grande massa comandada que, apesar do mau
exemplo, esforça-se para sobreviver e progredir.
Não passa dia sem
depararmos com manchete de escândalos. Tornou-se quase banal a notícia de
indiciamento de autoridades dos diversos escalões não só por um crime, mas por
vários, incluindo o de formação de quadrilha, como por último consignado em
denúncia do Procurador-Geral da República, Doutor Antônio Fernando Barros e
Silva de Souza.
A rotina de desfaçatez e
indignidade parece não ter limites, levando os já conformados cidadãos
brasileiros a uma apatia cada vez mais surpreendente, como se tudo fosse muito
natural e devesse ser assim mesmo; como se todos os homens públicos, nas mais
diferentes épocas, fossem e tivessem sido igualmente desonestos, numa mistura
indistinta de escárnio e afronta, e o erro passado justificasse os erros
presentes.
A repulsa dos que sabem o
valor do trabalho árduo se transformou em indiferença e desdém. E seguimos como
se nada estivesse acontecendo.
Perplexos, percebemos, na
simples comparação entre o discurso oficial e as notícias jornalísticas, que o
Brasil se tornou um país do faz-de-conta.
Faz de conta que não se
produziu o maior dos escândalos nacionais, que os culpados nada sabiam ─ o que
lhes daria uma carta de alforria prévia para continuar agindo como se nada de
mal houvessem feito.
Faz de conta que não
foram usadas as mais descaradas falcatruas para desviar milhões de reais, num
prejuízo irreversível em país de tantos miseráveis.
Faz de conta que tais
tipos de abusos não continuam se reproduzindo à plena luz, num desafio cínico à
supremacia da lei, cuja observação é tão necessária em momentos conturbados.
Se, por um lado, tal
conduta preocupa, porquanto é de analfabetos políticos que se alimentam os
autoritarismos, de outro surge insofismável a solidez das instituições
nacionais. O Brasil, de forma definitiva e consistente, decidiu pelo Estado
Democrático de Direito.
Não paira dúvida sobre a
permanência do regime democrático. Inexiste, em horizonte próximo ou remoto, a
possibilidade de retrocesso ou desordem institucional. De maneira adulta,
confrontamo-nos com uma crise ética sem precedentes e dela haveremos de sair
melhores e mais fortes.
Em Medicina, “crise”
traduz o momento que define a evolução da doença para a cura ou para a morte.
Que saiamos dessa com invencíveis anticorpos contra a corrupção, principalmente
a dos valores morais, sem a qual nenhuma outra subsiste.
Nesse processo de
convalescença e cicatrização, é inescusável apontar o papel do Judiciário, que
não pode se furtar de assumir a parcela de responsabilidade nessa avalancha de
delitos que sacode o País.
Quem ousará discordar que
a crença na impunidade é que fermenta o ímpeto transgressor, a ostensiva
arrogância na hora de burlar todos os ordenamentos, inclusive os legais?
Quem negará que a já
lendária morosidade processual acentua a ganância daqueles que consideram não
ter a lei braços para alcançar os autoproclamados donos do poder?
Quem sobriamente apostará
na punição exemplar dos responsáveis pela sordidez que enlameou gabinetes
privados e administrativos, transformando-os em balcões de tenebrosas
negociações?
Essa pecha de lentidão
recai sobre o Judiciário injustamente, já que não lhe cabe outro procedimento
senão fazer cumprir a lei, essa mesma lei que por vezes o engessa e
desmoraliza, recusando-lhe os meios de proclamar a Justiça com efetividade, com
o poder de persuasão devido.
Pois bem, se aqueles que
deveriam buscar o aperfeiçoamento dos mecanismos preferem ocultar-se por trás
de negociatas, que o façam sem a falsa proteção do mandato. A República não
suporta mais tanto desvio de conduta.
Ao reverso do abatimento
e da inércia, é hora de conclamar o povo, principalmente os mais jovens, a se
manifestar pela cura, não pela doença, não pela podridão do vale-tudo, que
corrói, com a acidez do cinismo, a perspectiva de um futuro embasado em valores
como retidão, dignidade, grandeza de caráter, amor à causa pública, firmeza de
propósitos no empenho incondicional ao progresso efetivo, e não meramente
marqueteiro, do País.
Ao usar a voz da urna, o
povo brasileiro certamente ouvirá o eco vitorioso da cidadania, da verdade ─
que, sendo o maior dos argumentos, mais dia, menos dia, aparecerá.
Àqueles que continuam
zombando diante de tão simples obviedades, é bom lembrar que não são poucos os
homens públicos brasileiros sérios, cuja honra não se afasta com o tilintar de
moedas, com promessas de poder ou mesmo com retaliações, e que a imensa maioria
dos servidores públicos abomina a falta de princípios dos inescrupulosos que
pretendem vergar o Estado ao peso de ideologias espúrias, de mirabolantes
projetos de poder.
Aos que laboram em
tamanhas tolices, nunca é demais frisar que se a ordem jurídica não aceita o
desconhecimento da lei como escusa até do mais humilde dos cidadãos, muito
menos há de admitir a desinformação dos fatos pelos agentes públicos, a
brandirem a ignorância dos acontecimentos como tábua de salvação.
Incumbe a cada eleitor
perceber que o voto, embora individualizado, a tantos outros se seguirá,
formando o grande todo necessário à escolha daqueles que o representarão.
Impõe-se, nesse sagrado
direito-dever, a conscientização, a análise do perfil, da vida pregressa
daqueles que se apresentem, é de presumir – repito – para servir com
honestidade de propósito e amor aos concidadãos, dispostos, acima de tudo, a
honrar a coisa pública.
O Judiciário
compromete-se com redobrado desvelo na aplicação da lei. Não haverá
contemporizações a pretexto de eventuais lacunas da lei, até porque, se omissa
a legislação, cumpre ao magistrado interpretá-la à luz dos princípios do
Direito, dos institutos de hermenêutica, atendendo aos anseios dos cidadãos,
aos anseios da coletividade.
Que ninguém se engane:
não ocorrerá tergiversação capaz de turbar o real objetivo da lei, nem
artifício conducente a legitimar a aparente vontade das urnas, se o pleito
mostrar-se eivado de irregularidades.
Esqueçam, por exemplo, a
aprovação de contas com as famosas ressalvas. Passem ao largo das chicanas, dos
jeitinhos, dos ardis possibilitados pelas entrelinhas dos diplomas legais.
Repito: não haverá
condescendência de qualquer ordem. Nenhum fim legitimará o meio condenável. A
lei será aplicada com a maior austeridade possível – como, de resto, é o que
deve ser. Bem se vê que os anticorpos de que já falei começam a produzir os
efeitos almejados. Esta é a vontade esmagadora dos brasileiros.
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(*) Palavras pronunciadas
em maio de 2006 pelo Ministro Marco Aurélio Mello, do STF, por ocasião de sua
posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Infelizmente, uso esta
palavra que é a mesma com a qual o Ministro Marco Aurélio usa para começar seu
belo discurso que vocês acabaram de ler (se não leram, voltem e leiam), não há
previsão para o comportamento humano, quando se trata de sua saúde. Li há pouco
que a Ação Penal 470, que já decidiu levar o Marcos Valério à cadeia, vai ter
um paradeiro devido à doença do meu e nosso super-homem, o Min. Joaquim
Barbosa.
Penso que todo o Brasil
responsável, o que só não inclui o PT e algumas figuras que estão tão atreladas
à farra da república dos últimos anos, gostaria que o julgamento terminasse e
todos fossem devidamente apenados, já que foram condenados. Se eu lá estivesse,
mesmo sem toga, eu aconselharia, na dosemetria, 13 anos para o petistas
envolvidos. Seria uma “trezemetria” para o povo brasileiro lembrar que estamos
no limiar de uma nova era, o que me lembra o Charleston Heston, como Moisés
entregando os Dez Mandamentos para o seu povo.
Soube que o ministro
Marco Aurélio Mello contou no voto final do processo um “bastidor” de 2006,
quando avisou ao presidente do Senado que seria melhor o presidente Lula não ir
à posse dele na presidência do Tribunal Superior Eleitoral porque no discurso
daria um forte “recado”. E é fato que, mesmo sem saber do conteúdo do discurso,
Lula, que voltava de uma viagem ao Chile e já havia posto a posse de Marco
Aurélio na agenda, achou melhor não ouvir e desistiu de ir.
Como ficou claro, todo o
discurso foi feito para o ex-apedeuta-mor, mas ainda apedeuta, Lula, e só
pensando nele e no seu governo que se revelou o mais corrupto da história do
país, com atestado passado em cartório do STF. E hoje, é este homem que vive a
correr o país tentando eleger prefeito, mesmo com um câncer na garganta. Por
que? Simplesmente medo de que o Procurador Geral da República o vejo sentado
acima do Dirceu, dando as ordens, e o entregue na mão do super-homem Joaquim
Barbosa (para quem, mesmo sem ofícios pomposos como os do vereador Carlos
Alberto) eu desejo pronto restabelecimento e que volte logo, para colocar o
restante do time mensaleiro atrás das grades. (LP)