Ontem estava tentando terminar meu texto sobre o QUINTETO DO
POETA quando me deparei com a GURIZADA FANDANGUEIRA, que é agora um quinteto também (infelizmente) e
que causou a maior tragédia do Brasil, em muitos anos. É hora por enquanto de
deixar o Poeta de lado e sofrer junto com o Brasil e especialmente com os
parentes mais próximos de tantos jovens que perderam a vida em Santa Maria, lá
no Rio Grande do Sul.
A imprensa já imprensou tanto o fato, com erros e com
acertos, que é muito difícil que escrevamos sobre o fato, dizendo coisas
diferentes. Então resolvi reproduzir abaixo o texto mais sensato, sensível e
bem escrito que vi sobre o episódio. Ele foi escrito pelo Reinaldo Azevedo e eu
o vi publicado na página da AGD: Deu nos
blogs, com o título: Tragédia.
Não me refreando nos aspectos políticos, sempre existentes
em qualquer questão, concordo com o Reinaldo sobre o comportamento de Dilma,
com uma pequenina queixa, ressalvando que ela pode nem ter culpa: Precisava o
Planalto distribuir uma foto da presidenta, beijando parente das vítimas?
Quanto ao comportamento do Lula e Marisa de enviar notinhas para a imprensa é
digno de um ex que não enxerga seu lugar. Já estou esperando a nota da Rose. E
fiquem com o texto citado acima, que foi o melhor que encontrei.
“O país parou para
acompanhar detalhes de uma das maiores tragédias de sua história. Duzentos e
trinta e um moços e moças saíram de casa para se divertir na noite de sábado e
jamais voltarão. Morreram queimados ou asfixiados — a grande maioria — na boate
Kiss, na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Ficamos, especialmente os
pais de adolescentes e jovens, paralisados de medo, de apreensão, de terror.
Qualquer morte nos diminui. A de um ente querido nos destroça. A de um filho,
então, subverte aquele que é o nosso mais duro aprendizado: morrer um pouco por
dia para que sobreviva a nossa descendência. Em “Cântico do Calvário”, escrito
justamente em memória de um filho morto, Fagundes Varela pôs nos justos termos:
“Eras na vida a pomba predileta
Que sobre um mar de angústias conduzia
O ramo da esperança. — Eras a estrela
Que entre as névoas do inverno cintilava
Apontando o caminho ao pegureiro.”
Penso na dor dessas
mães e desses pais e rezo para que encontrem algum conforto. Lembro-me de ter
me irritado certa feita com a minha mãe por causa de seu excesso de
preocupação, ainda que estivéssemos a centenas de quilômetros de distância:
“Pô, eu sei o que faço; já tenho mais de trinta anos”. E ouvi do outro lado: “E
continua meu filho; filho não tem idade para mãe e para pai”. Hoje sou eu que
ouço: “Pai, eu já tenho 18, já tenho 16…” Filhos não têm idade. As nossas
crianças têm de voltar para que possamos fechar a porta, deixando do lado de
fora as tormentas.
Mas a nossa dor também
tem de saber exercitar a devida ira. Com a conivência de muitos, a Kiss não era
uma boate, mas uma armadilha. Parece evidente que muitos milhares se arriscaram
antes a morrer nas suas dependências. Faltava apenas o casamento do fortuito
com o inexorável. As imprudências meticulosa e metodicamente praticadas
careciam do elemento incidental, da estupidez que serve de estopim, do gesto
tolo, irrelevante, que provoca a reação em cadeia e resulta na tragédia.
Na madrugada de sábado
para domingo, ele veio na forma de um sinalizador, uma espécie de fogos de
artifício, usado pela banda. Uma fagulha atingiu o teto de papelão e material
de proteção acústica, altamente inflamáveis. Em segundos, o fogo se espalhou
pelo teto. Estima-se que 90% das vítimas fatais tenham morrido asfixiadas pela
fumaça, não queimadas. Talvez duas portas de emergência, destravadas, tivessem
bastado para evitar a tragédia.
O Plano de Prevenção
de Combate a Incêndio tinha vencido em agosto do ano passado e não havia sido
renovado, informa o comandante-geral do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do
Sul, coronel Guido Pedroso de Melo. É, sim, uma informação relevante, que
parece indicar que a casa não primava exatamente pelo respeito às regras. Mas
essa informação pode contribuir para omitir outra, que me parece ainda mais
importante: quer dizer que, até agosto de 2012, o Corpo de Bombeiros julgava
que tudo ia bem num imóvel que abriga duas mil pessoas e tem uma única porta.
Ela não só servia à entrada e à saída dos frequentadores como era obstruída por
uma espécie de biombo, que impedia os seguranças de ver o que se passava lá
dentro, razão por que, por alguns poucos minutos, eles tentaram impedir a fuga
dos jovens, supondo que queriam sair sem pagar a conta.
O incêndio causou um
curto-circuito e deixou a moçada no escuro, em meio à fumaça. Não havia luzes
de emergência, acionadas automaticamente quando há o corte do fornecimento de
energia elétrica. Um extintor também não teria funcionado. A boate Kiss não
poderia, naquelas condições, estar funcionando. E não era um empreendimento
pequeno, que tivesse existência clandestina. Talvez fosse a maior casa do
gênero em Santa Maria, uma cidade de porte médio, com 230 mil habitantes, mas
com vida noturna agitada em razão da universidade federal, que atrai jovens do
Brasil inteiro. A festa de sábado tinha sido organizada por alunos do primeiro
ano dos cursos de de Tecnologia de Alimentos, Agronomia, Medicina Veterinária,
Zootecnia, Tecnologia em Agronegócio e Pedagogia.
Estupidez
Não, senhores! Essa
não é uma tragédia fabricada pelo acaso. Ela é obra de uma cadeia de descasos.
Uma casa dessas dimensões tem de ter, por exemplo, uma brigada civil de combate
a incêndios. A ela caberia dizer à tal banda “Gurizada Fandangueira” que o
ambiente era impróprio para o uso de fogos de artifício.
Que se apurem as
responsabilidades. Não sou polícia técnica nem perito. Mas há elementos de
sobra para concluir que a “fatalidade” que resultou na morte de 231 jovens foi
construída. Eles foram mortos pela estupidez, não pelo destino.
PS – Por mais que
fique constrangido e até envergonhado de escrever isto num texto dessa
natureza, é inevitável. Vamos lá. Dilma Rousseff fez bem ao interromper a sua
viagem e se deslocar para Santa Maria. É a presidente de todos os brasileiros,
e uma grande tragédia aconteceu por lá. Goste-se ou não disso, representa todos
os brasileiros. A presidente chorou, e acho que estava sendo sincera.
Dispensável, porque tem o cheiro inevitável da exploração política, é a nota de
Lula e sua mulher, Marisa. Ele não exerce mais cargo público. E não se espera
que cada político se manifeste a respeito. Dilma está investida do cargo mais
importante da República. Ele, embora não se dê conta disso, não. É só mais uma
evidência de que não tem mesmo limites.”
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