Por Mary Zaidan (*)
Guia de Dilma Rousseff na cerimônia de entronização e no
encontro privado com o Papa Francisco, em uma viagem que ficará marcada pelo
contraste entre a gastança da comitiva brasileira e a pregação pelos pobres
feita pelo Pontífice, o ministro Gilberto Carvalho não se apoquenta. Nem quando
quebra ou deixa quebrar, diante de seu nariz, símbolos de sua fé.
Católico (foi ligado à Pastoral Operária), Carvalho é também
porta-voz e apara-arestas do governo e das campanhas majoritárias petistas
junto aos evangélicos. Na última sexta-feira, representava a presidente na
Convenção Nacional das Assembleias de Deus, realizada em São Paulo.
Ali, ouviu impassível seu colega de governo Marcelo Crivella
(PRB), ministro da Pesca, conclamar mais de três mil pastores a aplaudir o
governo porque as políticas voltadas aos pobres permitiram aumentar a
arrecadação de suas igrejas. "A nossa presidenta e o presidente Lula
fizeram a gente crescer porque apoiaram os pobres. E o que nos sustenta são
dízimos e ofertas de pessoas simples e humildes.”
Parece brincadeira, mas não é.
Da saia-justa que lhe impôs Crivella, Carvalho escapou sem
dar um pio. O mesmo não pode fazer com os custos exorbitantes da estadia em
Roma – quatro dias para pouco mais de cinco horas de agenda oficial, gastos de
R$ 324 mil só em hospedagem, sem contar os 21 veículos locados, refeições e
diárias adicionais. Sem conseguir explicar o inexplicável, considerou o tema
como “falta de assunto” e ponto.
Ambos os casos ilustram de maneira cristalina como o governo
vê e lida com os mais pobres. Os mesmos pobres que inflam a popularidade
recorde da presidente.
Em Roma, para ver o Papa apologista da simplicidade,
considerou-se normal, ou pior, de praxe, que a presidente e seus ministros –
aliás, o que mesmo o ministro da Educação Aloisio Mercadante foi fazer lá? - se
hospedassem em um dos hotéis mais luxuosos da Europa, pagos pelos impostos dos
brasileiros.
Entre os 132 chefes de estado presentes à cerimônia de
entronização, só o vice-presidente dos EUA e o presidente de Taiwan ficaram no
mesmo hotel de Dilma.
Mas, se como diz Carvalho isso é falta de assunto, vamos ao
dízimo.
"Com a presidenta Dilma, os juros baixaram. Quem paga
juros é pobre. Com menos juros, mais dízimo e mais oferta", explicou o
ministro da Pesca, diante do secretário-geral da Presidência. Não recebeu
qualquer reprimenda. Talvez porque aqui a semelhança não seja mera
coincidência.
A lógica cartesiana que o evangélico Crivella expôs é a
mesma que orienta os passos da campanha pela reeleição da presidente: o dízimo
é o voto.
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(*) Publicado no Blog do Noblat em 24.03.2013. Para quem
está sem tempo, arrumando os matulões para subir a serra, com a ilusão que lá
está mais fresco do que aqui, durante a Semana Santa, o texto da Mary acima vem
a calhar. Ela fala de dízimo, e isto tem tudo a ver com a religião, como a
própria Semana Santa.
O dízimo é um velho companheiro das religiões, desde Abraão
e já dele se fala no Antigo Testamento. Ele sempre foi uma espécie de imposto
cuja alíquota, 10%, incidia sobre várias coisas, em bens ou dinheiro. Eu, como
católica já paguei dízimo, embora nunca soube que fosse obrigatório em nossa
Igreja. Nunca procurei saber. Só sei que o Papa Bento XVI retirou este nome dos
Mandamentos da Igreja, o que foi muito melhor. Hoje se contribui de acordo com
as possibilidades e o percentual é variável. O nome dízimo traz modernamente, tristes lembranças. E não sou contra a
que se coopere com as Igrejas. Qualquer uma.
No entanto, alguns Igrejas, pelo que se tem visto,
avacalharam com a ideia, quase obrigando os fiéis usarem o seu dinheiro para
enricar pastores em nome de Deus. O que achei espantoso no bispo Crivella (não
sei se ele é bispo ou já passou a Papa, ao se tornar o Ministro da Pesca
querendo virar São Pedro), citado pela Mary, foi sua sinceridade ao confessar
um apostasia. A desfaçatez não tem limites. Eu acho que pobres sempre existirão
na face da terra, mas, querer que eles aumentem para aumentar o dízimo é
demais. E isto é o que ele está querendo dizer, pois, ao invés de comprar mais
coisas com a diminuição dos juros, ele deve dar mais à Igreja, e consequente
enriquecimento dos pastores. Então quanto mais pobres melhor, pois eles é que
pagam juros, segundo o bispo.
Esta é uma das declarações que nos fazem querer distância de
determinadas correntes religiosas, que de Religião só tem as penas. É em cima
da cobrança do dízimo que o Pastor Feliciano, em vídeo recente, clamava para
que um fiel deixasse a senha do seu cartão de crédito para que Deus atuasse em
seu benefício. Não discrimino entre religiões mesmo sendo católica e achar
minha Igreja a verdadeira Igreja, mas, chamar a estas seitas produtoras de
novos ricos de religião, é forçar demais a barra.
Que Deus tenha pena das almas destes hereges neste belo
período de Semana Santa tão importante para nós cristãos. Pelo menos para os
verdadeiros. (LP)
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