Por Diretor Presidente (*)
No dia em que escrevo é o aniversário de Recife e de Olinda.
Não vou historiar sobre estas duas belas cidades, que olham uma para outra há
mais de 470 anos. Relação entre irmãs, nem sempre pacífica e sem
desentendimentos. No final, como boas irmãs, elas se entendem. Vê-las-ei por
outro ângulo. O de uma terceira cidade tão distante e tão perto. Bom Conselho.
Os vínculos entre estas três cidades são evidentes. Noves
fora política partidária, Olinda teve dois dos seus melhores prefeitos vindos
de Bom Conselho. Alguém já disse que uma das grandes vocações dos jovens de Bom
Conselho era ser prefeito de Olinda. Este é um vínculo visível e real mas, o
principal é aquele que por muito tempo, junto com o Recife, existiu, o de ser a
Meca das pessoas de Bom Conselho, em busca de estudo e oportunidades.
Deter-me-ei em Recife, pois este foi o meu caso. Terminado o
Curso Ginasial no Ginásio São Geraldo, que sempre nos iluminou e prometia que
nos daria no futuro o segredo da vitória. Mas, aonde? Ficar entre os quatro
muros da terrinha era muito pouco para mim, embora reconheça que cada um tem seus
objetivos e, assim alguns ficaram e fizeram lá sua vitória. Eu e outros que
pretendíamos mais e tínhamos condições materiais para isto, emigramos, e, sem
cálculo preciso, o destino de 90% era, inicialmente o Recife. Alguns ainda iam
dar um passeio por Garanhuns, mas terminavam no Recife.
O Recife foi a segunda pátria de muitos de Bom Conselho. Uma
pátria bonita, nem sempre generosa mas, sempre acolhedora. Cada um tinha a sua
dificuldade específica. Alguns em seus apartamentos alugadas em local nobres, outros
em pensões insalubres, outros em casas de parentes, outros ainda em casas
próprias para onde traziam outros que não as tinham. E todos a procurar
colégios, para estudar pela manhã, pela tarde, pela noite. Todos, de uma forma
ou de outra conseguiam o seu canto. Para aqueles pouco estudiosos, mas com
grana, ainda restava o Carneiro Leão, que diziam ser PP, pagou passou. O mais
procurado era o Colégio Estadual de Pernambuco, o chamado Ginásio Pernambucano.
Eu fui para lá mas, não foi fácil conseguir vaga. Era uma verdadeira
Universidade, pela qualidade de seus professores, os quais encontrei muitos
deles depois na UFPE.
Este colégio me dá saudade, não somente pelos colegas que
tive ou pelas boas horas pelas quais lá passei. Me dá saudade maior é de uma educação
pública de qualidade. Posso até dizer que ele foi um marco da educação pública
no Brasil. Com a decadência do Colégio Estadual, perto da década de 80, a
educação pública foi também a pique.
Mas não é só de educação que quero falar deste Recife mais
do que quatrocentão. Havia o Gemba, na Rua da Aurora, que tinha um sorvete
obrigatório para quem ia assistir a alguma filme no Cine São Luiz, e que tinha
um paletó para entrar. O Art-Palacio, o Cine Trianon, o Cine Moderno, e mesmo o
mais novo deles o Cine Veneza. Naquela época ainda existia um cinema em cada
bairro. Em Casa Amarela podíamos ir para escolher entre três, inclusive o
Albatroz.
As ruas calmas e tranquilas, mesmo nos dias de semana, com
dois ou três fuscas passando pela ponte Duarte Coelho, os passeios entre as
Ruas Nova e Imperatriz, com a visita obrigatória à Viana Leal, onde andei pela
primeira vez numa escada rolante. Ali eu não sabia que ainda ia rolar tanto
pelo vida e pelo mundo. Uma olhada na vitrine muito bem feita da Slopper e nos
cartazes dos cinemas ali perto.
Esperar, em dias de competição que os barcos a remo
singrassem o Rio Capibaribe, enquanto admirava as belezas do Teatro Santa
Isabel e mesmo o modernismo do prédio dos Correios. Não havia assaltantes,
ladrões, e nem mesmo víamos policiais.
Mas nem só do espírito vive o homem, principalmente o homem
novo e hormonalmente instável. Barão do Rio Branco, Rua da Guia, Rua do Bom
Jesus, enfim, Recife Antigo, hoje um ponto turísticos de nossa “quatrocentona”
cidade. Naquela época não íamos lá para correr atrás do Bloco da Saudade, íamos
para não fazer grandes esforços manuais e não ficar na saudade. Muitos dos
bom-conselhenses machões que conheci na minha época, e que contavam grandes
façanhas sexuais nas reuniões das praças e rodoviária de Bom Conselho, chegaram
aqui mais virgens do que a Venus de Milo. Normalmente, esta virgindade era
curada com uma doença venérea na Rua da Guia e adjascências.
Camisinha naquela época só de bebê pagão. Tínhamos a maior
vergonha de chegar na farmácia de Ivan e comprar, e mesmo aqui em Recife,
arriscávamos na loteria. Parece mentira mas nunca acertei no azar grande. Na
pensão onde morava, meus colegas, depois do passeio, passavam três dias indo ao
banheiro preocupados, e quando gemiam, eram logo alijados do convívio no
banheiro. Tinha que começar no Benzentacil, e usar outro banheiro, até parar de
pingar.
Atualmente é muito diferente. Mas, sabe de uma coisa, vamos
ficar por aqui para não conspurcar nossa saudade de nossa bela segunda pátria.
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(*) Publicado no Blog da CIT em 16.03.2010. Eu não escrevi
nada sobre o aniversário de Recife e Olinda no último dia 12. Não tive tempo.
Estava comemorando meus 70.000 acessos. Fui então ao Blog da CIT e encontrei
este texto do Diretor Presidente. Belíssimo texto apesar das intimidades.
Quero dizer que o Diretor Presidente, apesar de um pouco
desaparecido, da última vez que soube dele, estava em Bom Conselho curtindo seu
exílio forçado pelas mentiras do Dr. Filhinho. Foi ele quem mais sofreu com a infâmia levantada de que não era ele quem escrevia seus artigos. Eu
vi a hora o homem morrer, mas, graças a Deus não chegou a tanto. Mas, este
boato conseguiu acabar com um dos melhores blogs que Bom Conselho já teve,
modéstia à parte que me toca.
A republicação deste texto que levou até a estudantes
universitárias a aproveitá-lo para seus trabalhos acadêmicos (veja aqui), é
uma homenagem justa ao Diretor Presidente, e pedindo a Deus que ele volte ao
nosso convívio. Pelo menos o meu blog está à sua disposição. Serve também como
homenagem a Recife e Olinda (apesar de atrasada), principalmente, a primeira que agora se viu livre
do PT e respira mais aliviada.
Nesta busca pelos Blog da CIT encontrei outro texto (meu)
que republicarei quando o tempo faltar para outros, mais importantes e atuais. (LP)
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